Blog complementar de conteúdos que alimentam a página principal da Rede Brasileira de Budistas Engajados: http://budistasengajados.blogspot.com

sábado, 15 de setembro de 2007

TEXTOS E REFLEXÕES SOBRE A REALIDADE CONTEMPORÂNEA

As Conexões Ocultas

Palestra proferida por Fritjof Capra
* em 11 de agosto de 2003 no Instituto para o Desenvolvimento SocioAmbiental em São Paulo

(Transcrição e tradução: Cylene A. S. Dantas da Gama)


Introdução

É um grande prazer para mim estar de volta a São Paulo e desfrutar desta oportunidade de discutir algumas idéias com vocês, idéias estas que desenvolvi nos últimos cinco anos e que são agora publicadas no meu novo livro, As Conexões Ocultas. O título do livro origina-se de palestra proferida pelo estadista e dramaturgo checo Václav Havel, onde afirmou: “Educação hoje consiste na habilidade de perceber as conexões ocultas entre os fenômenos”. Em termos de ciência, nos reportamos a esta habilidade como pensamento sistêmico, ou pensamento de sistemas. ”Alude ao pensamento em termos de relacionamentos, padrões e contextos”.

Neste livro eu utilizo pensamento sistêmico e alguns dos conceitos chave de teoria da complexidade para desenvolver um arcabouço conceitual que integre as três dimensões da vida: biológica, cognitiva e social. Eu estendo a abordagem dos sistemas para os domínios social e cultural e busco aplica-la a alguns dos tópicos mais relevantes de nosso tempo.

Redes vivas

Uma das mais importantes considerações da compreensão sistêmica da vida é a do reconhecimento que redes constituem o padrão básico de organização de todo e qualquer sistema vivente. Ecossistemas são entendidos em forma de teias de alimento (isto é, redes de organismos); organismos são redes de células; e células são redes de moléculas. Rede é um padrão comum a todo tipo de vida.

Onde quer que nos deparemos com vida, constatamos redes. Um exame mais próximo destas redes de vida demonstra que sua característica chave implica autogeração. Em uma célula, por exemplo, todas as estruturas biológicas são produzidas, reparadas e regeneradas de forma continua por uma rede de reações químicas. Similarmente, ao nível de um organismo multicelular, as células do corpo são continuamente regeneradas e recicladas pela rede metabólica do organismo. Redes vivas de forma contínua criam ou recriam a si próprias, quer transformando ou substituindo seus componentes.

A vida no campo social também pode ser compreendida em termos de rede, mas não estamos aqui abordando reações químicas; e sim comunicações. Redes vivas em comunidades humanas são as redes de comunicação. Assim como as redes biológicas são também autogeradoras, mas o que geram é especialmente o impalpável. Cada comunicação cria pensamentos e significados, os quais por sua vez dão lugar a comunicações posteriores, e assim uma rede inteira gera a si própria.

À medida que comunicações continuam a se desenvolver na rede social, eventualmente produzirão um sistema compartilhado de crenças, explicações, e valores — um contexto comum de significados, conhecidos como cultura, o qual é continuadamente sustentado por comunicações adicionais. É através da cultura que os indivíduos adquirem identidade como membros da rede social.

A análise de similaridades e diferenças entre redes biológica e social é central a minha síntese da nova abordagem cientifica da vida. Meu objetivo não é tão somente oferecer uma visão unificada de vida, mente e sociedade, mas também desenvolver uma abordagem sistêmica, coerente com os tópicos críticos de nosso tempo.

À medida que este novo século desponta, dois desenvolvimentos resultarão em impactos de monta no bem estar e no modus vivendi da humanidade. Ambos tem tudo a ver com redes e ambos radicalmente envolvem novas tecnologias. Um deles é o crescimento global do capitalismo, o outro a criação de comunidades sustentáveis lastreadas na prática do planejamento ecológico (ecodesign). No que tange ao capitalismo global, as redes eletrônicas de financiamento e de fluxo da informação, e quanto ao eco-planejamento (ecodesign) as redes ecológicas de energia e o fluxo de material. O objetivo da economia global no seu contexto atual é maximizar a riqueza e o poder de suas elites; o objetivo do eco-planejamento (ecodesign) é maximizar a sustentabilidade da teia da vida. Permitam-me agora rever estes dois desenvolvimentos em maiores detalhes.

As redes do capitalismo global

Durante as três décadas passadas, a revolução da tecnologia da informação deu origem a um novo tipo de capitalismo, que é profundamente diferente daquele formado durante a revolução industrial ou daquele que emergiu após a Segunda Grande Guerra. É caracterizado por três aspectos fundamentais.

O cerne de suas atividades econômicas é global; as fontes principais de produtividade e competitividade são: inovação, geração de conhecimento e processamento da informação; e tudo isto está amplamente estruturado ao redor de redes de fluxos de financiamento. Este novo capitalismo global é também referido como “a nova economia” ou simplesmente “globalização”.

Na nova economia o capital trabalha em tempo real, movimentando-se rapidamente de uma opção para outra, numa busca global incansável por oportunidades de investimentos. Os movimentos deste cassino global, controlados eletronicamente, não se enquadram em nenhuma lógica de mercado.Os mercados são continuamente manipulados e transformados por estratégias de investimento acionadas por computador, pela análise de percepções subjetivas de analistas influentes, eventos políticos em qualquer parte do mundo e, mais significativamente, por turbulências imprevisíveis, resultantes de interações complexas do fluxo de capital neste sistema altamente não linear. Estas turbulências amplamente descontroladas resultaram em uma série de drásticas crises financeiras nos anos recentes.

O impacto da nova economia no bem estar do ser humano tem sido negativo até o presente momento. Enriqueceu a elite global de especuladores financeiros, empresários e profissionais de alta capacitação técnica, mas as conseqüências sociais e ambientais no seu todo, tem sido desastrosas.

Virando o jogo

Nos últimos anos, o impacto social e ecológico da globalização vem sendo discutido extensivamente por acadêmicos e lideres comunitários. Suas análises demonstram que a nova economia está produzindo uma resultante de conseqüências interligadas e de conseqüências danosas — aumentando a desigualdade social e a exclusão social, um colapso da democracia, deterioração mais rápida e abrangente do ambiente natural e ascensão da pobreza e alienação. O novo capitalismo global ameaça e destrói as comunidades locais por todo o globo; e amparado em conceitos de uma biotecnologia deletéria, invadiu a santidade da vida ao tentar mudar diversidade em monocultura, ecologia em engenharia, e a própria vida numa commodity.

Torna-se cada vez mais claro que o capitalismo global na sua forma atual é insustentável e necessita ser fundamentalmente replanejado. Na realidade, acadêmicos, líderes comunitários e ativistas populares, no mundo todo, estão erguendo suas vozes, exigindo o “virar do jogo” e sugerindo as maneiras concretas de faze-lo.

Qualquer discussão realista sobre o virar do jogo deve começar com o reconhecimento que a forma atual da globalização econômica foi conscientemente planejada e pode ser re-formatada. O mercado global, como é conhecido, é na verdade uma rede de máquinas programadas de acordo com o principio fundamental que gerar dinheiro deve preceder direitos humanos, democracia, proteção ambiental ou qualquer outro valor. Entretanto, as mesmas redes eletrônicas de financiamento e fluxo da informação poderiam incorporar outros valores, neles inseridos. O ponto crítico não é tecnologia e sim política.

A sociedade civil global

No despontar deste século, formou-se uma impressionante coalizão global de ONGs, lastreadas nos valores centrais da dignidade humana e da sustentabilidade ecológica. Em 1999, centenas destas organizações populares se conectaram eletronicamente por diversos meses, no preparo de um protesto de ações conjuntas na reunião da Organização Mundial do Comercio, em Seattle. A “Coalizão de Seattle” como é agora chamada, foi extremamente bem sucedida ao desvirtuar a reunião da OMC e por dar a conhecer ao mundo, seus pontos de vista. Suas ações orquestradas, baseadas em estratégias de rede, permanentemente modificaram o clima político no que dizia respeito ao tópico: globalização econômica.

Desde então a coalizão de Seattle (ou “movimento global pela justiça”) não só organizou protestos posteriores, mas também instituiu por duas vezes, um Fórum Social Mundial em Porto Alegre, Brasil. No segundo evento, as ONGs propuseram uma série completa de alternativas das práticas comerciais, incluindo-se propostas concretas e radicais para reestruturar as instituições financeiras globais, propostas estas que modificariam profundamente a natureza da globalização.

Os movimentos globais pela justiça exemplificam um novo tipo de movimento político, e que é típico da nossa Era da Informação. Devido à utilização habilidosa da Internet as ONGs da coalizão conseguiram se relacionar em rede, compartilhar informação e mobilizar seus membros com velocidade sem precedentes. Como resultado, as novas ONGs globais emergiram como atores efetivos, independentes das instituições nacionais ou internacionais. Elas constituem assim um novo tipo de sociedade civil global.

Há três tópicos, agrupados, que parecem ser o ponto focal para a maior e mais dinâmica coalizão de ativistas populares. Um é o desafio de reformatar as regras governamentais e as instituições da globalização; a segunda é a oposição aos alimentos geneticamente modificados e a promoção da agricultura sustentável, e a terceira é o eco-planejamento (ecodesign) — um esforço conjugado para re-configurar nossas estruturas físicas, cidades, tecnologias, e industrias, de modo a torná-las ecologicamente sustentáveis.

Eu devo agora centralizar no terceiro agrupamento, sustentabilidade ecológica e eco-planejamento (ecodesign).

Sustentabilidade ecológica

Uma comunidade sustentável é geralmente definida como aquela capaz de satisfazer suas necessidades e aspirações sem reduzir as probabilidades afins para as próximas gerações. Esta é uma exortação moral importante. Nos lembra a responsabilidade de transmitirmos aos nossos filhos e netos um mundo com oportunidades iguais as que herdamos. Entretanto esta definição não nos diz nada a respeito de construirmos uma comunidade sustentável. O que nós precisamos é de uma definição operacional de sustentabilidade ecológica.

A chave para tal definição operacional é a conscientização que não precisamos inventar comunidades humanas sustentáveis a partir do zero, mas que podemos modelá-las seguindo os ecossistemas da natureza, que são as comunidades sustentáveis de plantas, animais e micro-organismos. Uma vez que a característica notável da biosfera consiste em sua habilidade para sustentar a vida, uma comunidade humana sustentável deve ser planejada de forma que, suas formas de vida, negócios, economia, estruturas físicas e tecnologias não venham a interferir com a habilidade inerente à Natureza ou à sustentação da vida.

Eco-alfabetização e eco-planejamento

Estas definições implicam que o primeiro passo correlacionado ao nosso empenho para construir comunidades sustentáveis deve ser em direção a “alfabetização ecológica”, i.e., entender os princípios de organização evolutiva dos ecossistemas na sustentação da teia da vida. Nas próximas décadas a sobrevivência da humanidade dependerá de nossa alfabetização ecológica - nossa habilidade para entender os princípios básicos da ecologia e viver de acordo com sua observação. Isto significa que a eco-alfabetização deve se tornar uma qualificação indispensável para políticos, líderes empresariais e profissionais em todas as esferas, e deverá ser a parte mais importante da escolaridade, em todos os níveis – desde a escola primária até a escola secundária, faculdades e universidades e na educação continua e no treinamento de profissionais.

Nós temos que repassar para os nossos filhos os fatos fundamentais da vida: que a sobra abandonada por uma espécie é alimento para outra; que a matéria circula de forma contínua através da teia da vida, que a energia que promove os ciclos ecológicos fluem do sol; que a diversidade assegura flexibilidade, que a vida desde seus primórdios, mais de três bilhões de anos atrás, não assumiu o planeta através do combate, mas através de redes de trabalho integrado.

Eco-alfabetização é o primeiro passo na estrada da sustentabilidade. O segundo passo é movimentarse da eco-alfabetização para o eco-planejamento (ecodesign). Temos que aplicar nosso conhecimento ecológico para o replanejamento fundamental de nossas tecnologias e instituições sociais, de modo a estabelecermos uma ponte entre o planejamento humano e os sistemas ecologicamente sustentáveis da Natureza.

Planejamento, na acepção ampla da palavra, consiste em direcionar os fluxos de energia e da matéria, para a finalidade humana.O eco-planejamento (ecodesign) constitui um processo pelo qual nossos objetivos humanos são cuidadosamente entrelaçados com os padrões maiores e os fluxos do mundo natural. Os princípios do eco-planejamento refletem os princípios da organização evolutiva da natureza e que sustentam a teia da vida. Exercer a prática do planejamento industrial neste contexto requer uma mudança fundamental de atitude para com a natureza, é despojar-se do conceito “o que podemos extrair da natureza”, substituindo por “o que podemos aprender com ela”.

Em anos recentes houve aumento expressivo no número de projetos e práticas ecologicamente orientados, todos agora bem documentados. Por exemplo, constata-se um renascimento mundial da agricultura orgânica, ou da agroecologia. Fazendeiros que praticam o cultivo orgânico utilizam tecnologias baseadas no conhecimento ecológico, em detrimento da abordagem química ou da engenharia genética, para aumentar a produtividade, controlar a incidência de pragas e construir a fertilidade do solo. Um outro exemplo do planejamento ecológico é a organização de diferentes indústrias em agrupamentos ecológicos, onde as sobras ou o lixo de uma organização se tornem recursos para outras, assim como na natureza o lixo de uma espécie é alimento para outra.

Os planejadores ecológicos advogam uma mudança da economia orientada para o produto, para uma economia de “serviço e fluxo”. Da perspectiva do eco-planejamento (ecodesign) não faz sentido manter a propriedade do bem e então descartá-lo quando exaurir sua vida útil. Faz muito mais sentido adquirir os serviços inerentes, i.e. arrendar ou alugá-los. A propriedade é retida pelo fabricante, e findo o uso do produto, o fabricante reassume o bem, procede a decomposição de seus componentes básicos e os reutiliza na montagem de novos produtos ou os repassa para outras finalidades. Neste modelo de economia, a matéria prima industrial e os componentes técnicos circulam continuadamente entre fabricantes e usuários, e entre diferentes industrias.

A Energia do Sol

Finalmente, permitam-me falar sobre energia. Na sociedade sustentável, todas as atividades humanas e processos industriais devem se utilizar da energia solar, como acontece nos processos de ecossistemas da natureza. O papel crítico do carbono associado à mudança climática global evidencia que os combustíveis fósseis são insustentáveis a longo prazo. Conseqüentemente, mudar para uma sociedade sustentável, basicamente implica mudar de combustíveis fósseis para energia solar.

Realmente constatamos que no setor energético, a energia solar foi a de mais rápido crescimento na ultima década. A utilização de células fotovoltaicas aumentou cerca de 17% ao ano, na década de 90 e a energia eólica aumentou de forma mais espetacular ainda - aumentou cerca de 24 % ao ano na mesma década, e em 2001 a capacidade de geração da energia eólica aumentou, surpreendentemente, 31%.

Qualquer programa confiável referente a energia solar terá que disponibilizar suficiente combustível liquido para acionar aviões, ônibus, carros e caminhões. Até recentemente este foi o calcanhar de Aquiles em todos os cenários de energia renovável. Nos últimos anos, entretanto, este problema foi espetacularmente contornado, com a solução do desenvolvimento de eficientes células combustíveis de hidrogênio, que prometem inaugurar uma nova era na geração de energia com a “economia do hidrogênio”.

Uma célula combustível é um aparato eletroquímico que combina hidrogênio com oxigênio para produzir eletricidade e água – nada mais! Isto faz do hidrogênio a última palavra em combustível limpo. Diversas companhias pelo mundo estão agora empenhadas na oportunidade de serem as primeiras a produzirem comercialmente o sistema residencial de células combustíveis.

Neste meio tempo, a Islândia investiu capital de risco de alguns milhões de dólares para criar a primeira economia do hidrogênio. Para leva-lo a efeito, a Islândia utilizará seu vasto potencial de recursos geotérmicos e hidroelétricos para gerar hidrogênio a partir da água do mar, recursos que serão alocados primeiramente em ônibus e a seguir em carros de passageiros e barcos pesqueiros. A meta do governo é completar a transição para o hidrogênio entre 2030 e 2040.

Alguns meses atrás, a União Européia se comprometeu a investir mais de dois bilhões de euros, para os próximos cinco anos, nos projetos de pesquisa em energia sustentável, com o foco direcionado para células de combustível de hidrogênio. A União Européia estabeleceu a meta de obter 22% de sua eletricidade, por volta de 2010, a partir de fontes renováveis.

O gás natural representa, atualmente, a fonte mais comum do hidrogênio, mas a separação a partir da água, com a ajuda de fontes renováveis de energia (especialmente energia eólica) será, em longo prazo, o meio mais econômico e limpo. Quando isto se materializar teremos criado um verdadeiro sistema sustentável de geração de energia, usando a energia solar para decompor a água em oxigênio e hidrogênio, produzindo eletricidade a partir do hidrogênio, e terminando com a água, outra vez.

Hiper -carros

Paralelamente com a mudança para fontes de energia renováveis há uma nova configuração para automóveis, que pode estar associada ao ramo do eco-planejamento, com conseqüências industriais de mais longo alcance. Compreende uma radicalização conceitual de idéias que devem não só alterar e tornar irreconhecível a indústria automobilística conforme a concebemos hoje, mas também eliminar os efeitos associados às industrias do petróleo, aço e eletricidade.

O físico Amory Lovins e seus colegas do Rocky Mountain Institute, no Colorado, sintetizaram estas idéias no projeto conceitual do que eles denominaram o hiper-carro, combinando três elementos chave: É ultraleve, porque o metal padrão da carcaça é substituído por fibras de carvão fortalecidas, inseridas em plástico especial moldável, e que reduzem pela metade o peso do carro. Segundo, atribui ao hiper-carro uma alta eficiência aerodinâmica, e terceiro, é acionado por condução híbrido-elétrica, que combina motor elétrico com combustível que produz a eletricidade para o motor de bordo.

Quando estes três elementos estão integrados num único projeto, conseguem economizar pelo menos 70 a 80% do combustível utilizado em carros padrão, ao mesmo tempo em que os torna mais seguros e confortáveis.

Carros híbridos podem usar gasolina ou uma variedade de opções mais limpas. O modo mais eficiente, limpo e elegante consiste em utilizar hidrogênio em célula combustível. Esse automóvel não apenas opera silenciosamente e sem poluir, como ainda se torna de fato uma pequena usina sobre rodas. Quando o carro não estiver em uso, e isto representa a maior parte do tempo, a eletricidade resultante de seu combustível, pode ser transferida para uma rede elétrica e o proprietário automaticamente ser creditado pelos valores pertinentes.

Toyota e Honda foram as primeiras a disponibilizar carros híbridos, com enorme aumento de eficiência do combustível. O meu Toyota Prius faz de 17 a 19 km por litro (40-45 mpg). Carros similares vem sendo testados pela General Motors, Ford e Daimler Chrysler, e estão agora se encaminhando para a produção. Adicionalmente, carros com células combustíveis estão programados para produção dentro dos próximos três anos, pelas oito maiores indústrias automobilísticas.

A transição para a economia do hidrogênio

Nós estamos presentemente no limiar de uma transição histórica, da idade do petróleo para a idade do hidrogênio. Eu posso expressar isto com toda confiança, por três razões:

(1) As emissões resultantes da queima do petróleo já demonstraram o impacto devastador sobre o ambiente, em termos de poluição do ar e alteração climática, o que tende a aumentar com o aumento do consumo de energia.

(2) A produção global de petróleo chegará ao ápice nas próximas duas ou três décadas, e a partir daí o preço do petróleo se elevará continuadamente.

(3) As reservas remanescentes de petróleo estarão concentradas no Oriente Médio, política e socialmente tida como a região mais instável do mundo. Isto significa que o petróleo do Golfo Pérsico não oferecerá competitividade com outras fontes de energia, a se levar em conta os altos custos militares de segurança para manter fluxo contínuo. Nos Estados Unidos os custos militares para proteger cada barril de petróleo, já são mais altos que o custo do próprio petróleo, durante os últimos 10 anos, e com as novas políticas adotadas na administração Bush os custos tendem a se elevar.

Somados estes três aspectos da economia do petróleo, é evidente que o petróleo se tornará, eventualmente, não competitivo, quando comparado com o hidrogênio, e assim não valerá a pena investir na sua extração. O contexto tecnológico e político da transição para o hidrogênio, ainda não está claro, mas devemos nos dar conta que as modificações evolutivas de tal magnitude não podem ser evitadas por atividades políticas de curto prazo.

A transição para economia do hidrogênio resultará profundas conseqüências sociais e políticas, à medida que os paises gradualmente vão se tornando independentes do petróleo importado. Isto fundamentalmente modificará as práticas político-militares e de relações exteriores dos Estados Unidos, especialmente no Oriente Médio – práticas estas que são presentemente conduzidas pela percepção do petróleo como “recurso estratégico”. Esta mudança contribuirá expressivamente para o aumento da segurança mundial.

A economia do hidrogênio será ainda mais importante no mundo em desenvolvimento, onde a carência de energia, especialmente eletricidade, é fator chave na perpetuação da pobreza. Vilas e vilarejos nos mais distantes pontos do planeta poderão instalar tecnologias de energia renovável: fotovoltaica, eólica ou biomassa, para produzir hidrogênio a partir da água e fazer estoques para uso subseqüente em células combustíveis. A meta tem que embasar o fornecimento de células estacionárias de energia para cada vilarejo ou vizinhança no mundo em desenvolvimento. Ao se preencher as necessidades energéticas com recursos renováveis e hidrogênio, neste mundo em desenvolvimento, antecipam os bilhões de pessoas ultrapassando a barreira da pobreza.

Adicionalmente á geração de eletricidade, as células de hidrogênio também produzem água pura potável como produto derivado, vantagem significativa em comunidades remotas, onde o acesso à água limpa é freqüentemente difícil.

Concluindo, eu gostaria de enfatizar que a transição para um futuro sustentável, não mais configura um problema técnico ou conceitual. É um problema de valores e de empenho político. Conforme dissemos em Porto Alegre, “um outro mundo é possível”.

Fonte: www.ecoar.org.br


* Físico e teórico de sistemas, Fritjof Capra é o fundador e diretor do Centro de Eco-Alfabetização (Center for Ecoliteracy) de Berkeley, na Califórnia, que promove a educação ecológica e a incorporação do pensamento sistêmico nos ensinos primário e secundário. Membro da equipe do Schumacher College, um centro internacional de estudos ecológicos com sede no Reino Unido, é autor de diversas obras de referência do paradigma sistêmico - que propõe uma visão holística, dinâmica, orgânica e integrada da realidade - adotado por uma parte do mundo científico contemporâneo, como O Tao da Física (1975), O Ponto de Mutação (1983) e A Teia da Vida – Uma Nova Compreensão Científica dos Sistemas Vivos (1996). A palestra reproduzida aqui é baseada no seu livro mais recente: As Conexões Ocultas: Ciência para uma Vida Sustentável (2002). Para mais informações sobre o autor, clique aqui e leia a sua biografia.


Poste um comentário
e divida seu insight e suas considerações sobre o texto.

Clique aqui e volte à página Textos e Reflexões sobre a Realidade Contemporânea

Clique aqui e vá à página Reflexões sobre o Budismo Engajado

Volta à página da Rede Brasileira de Budistas Engajados: http://budistasengajados.blogspot.com

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom ..........mas se as conexões estão sendo apresentadas, não são mais ocultas.